O Meio Interestelar
Embora a maior parte da massa da nossa galáxia esteja concentrada
em estrelas, o meio interestelar não é completamente
vazio. Ele contém gás e poeira, na
forma de nuvens individuais, e também em um meio difuso.
O meio interestelar contém tipicamente um
átomo de hidrogênio por centímetro
cúbico e, aproximadamente, 100 grãos de poeira
por quilômetro cúbico.
Imagem de partes de M17 obtida nas bandas infravermelhas YJHK pelo telescópio
Gemini Sul, com a camara Flamingos 2.
Imagem composta da Nebulosa da Roseta
obtida por
©Ignacio de la Cueva Torregrosa.
Os glóbulos de gás e poeira estão sendo erodidos pela luz
e vento de estrelas massivas próximas. O filtro vermelho está
centrado na linha do enxofre, o verde no hidrogênio e o azul no oxigênio.
A nebulosa tem cerca de 50 anos luz de extensão e está a aproximadamente
4500 anos-luz de distância.
O meio interestelar compreende todo o material entre as
estrelas. A grande parte do gás é composta de
hidrogênio,
a poeira é composta principalmente de grafite,
silicatos e gelo de água,
em grãos de vários tamanhos,
mas muito menores (da ordem de 1 micrometro) do que a poeira aqui na Terra.
Aproximadamente 10% da massa da Via Láctea, nossa galáxia,
está na forma de gás interestelar e a poeira
agrupa menos de 1% da massa em gás.
Raios cósmicos,
que são partículas altamente energéticas,
estão misturados com o gás e a poeira. Existe também
um campo magnético galático, fraco (10 G).
No centro da foto vemos a nebulosa escura da Cabeça de Cavalo,
enquanto à esquerda vemos a Nebulosa de Órion,
na espada
da constelação do Órion. Trata-se de uma
região de formação estelar,
onde as estrelas mais massivas formam o Trapézio.
A nebulosa de Órion está a 1500 anos-luz de nós, tem 25 anos-luz de diâmetro,
uma densidade de 600 átomos/cm3 e temperatura de 70K.
A foto colorida é do
©Star Shadows Remote Observatory.
Detalhe da Cabeça de Cavalo obtida pelo Telescópio Espacial Hubble.
Detalhes da Nebulosa de
Órion e da
Trifid.
Duas fotos da Nebulosa do Caranguejo, os restos de uma supernova
cuja explosão foi observada no ano 1054
e está a 7000 anos-luz, na constelação do Touro. No
seu centro está o pulsar, girando 30 vezes por segundo.
Imagem da nebulosa de Órion obtida com o GEMS (sistema de ótica ativa multiconjugada) do telescópio Gemini sul
e uma nebulosa de relexão no Órion.
A quantidade de gás do meio interestelar diminui continuamente
com o tempo pois novas gerações de estrelas se formam
a partir do colapso de
nuvens moleculares gigantes.
Foto da nuvem molecular Barnard 68 que está
a 500 anos-luz da Terra, na direção da constelação de
Ofiúco, com cerca de meio ano-luz de diâmetro e com uma temperatura de -263C e está
colapsando.
A foto da esquerda foi obtida com o telescópio de 8,2
do European Southern Observatory, no ótico.
À direita está a foto em cor falsa
obtida no telescópio
de 3,5m do European Southern
Observatory, composta de três exposições no infravermelho,
em 1,25, 1,65 e 2,16μm
O colapso e fragmentação
destas nuvens
dão origem a cúmulos estelares, que são
agrupamentos de estrelas todas a aproximadamente a mesma
distância e de mesma idade.
Os cúmulos estelares se
dividem em cúmulos abertos, que contêm centenas
a poucos milhares de estrelas, e cúmulos
globulares, como este da foto, e contêm milhares
a centenas de milhares de estrelas.
Os cúmulos abertos estão no disco da nossa
galáxia, enquanto os globulares estão no bojo.
Como a função inicial de massa de formação estelar
favorece fortemente a formação de estrelas de baixa massa
(para cada estrela de massa de 10 massas solares, centenas
de estrelas de massa entre 0,5 e 1 massa solar são formadas),
e as estrelas de baixa massa perdem muito pouco de sua massa em sua
evolução, cada nova geração
de estrelas aprisiona o gás do meio interestelar.
O hidrogênio neutro (HI) emite uma linha espectral no comprimento de onda de
21 cm, que é usada para mapear a distribuição desse gás e que teve
um papel chave na determinação da estrutura espiral da Galáxia.
Mapa da distribuição de hidrogênio na nossa Galáxia. O centro
da Galáxia está indicado por um pequeno círculo azul.
Especificamente, os spins
(sentido de rotação)
do elétron e do próton, no hidrogênio neutro em seu estado
fundamental, podem ser paralelos (mesmo sentido de rotação)
ou, com ainda mais baixa energia, opostos. A diferença de energia
destes dois níveis é de
Associado ao spin existe um momento magnético dipolar,
já que trata-se de uma carga elétrica em movimento.
A diferença de energia entre esses dois
níveis corresponde a uma freqüência
de 1420,4 MHz. Portanto, a transição entre esses dois níveis
de estrutura hiperfina
dá origem a uma linha de comprimento de onda de 21,049 cm.
A existência dessa linha foi predita, teoricamente, pelo dinamarquês
Hendrick Christoffel van de Hulst
(1918-2000), em 1944, e observada pelos americanos Harold Irwin Ewen (1922-2015)
e Edward Mills Purcell (1912-1997)
em 1951 (Nature 168, 356). Por causa da alta abundância de hidrogênio,
apesar da longa vida média do estado
esta linha é observada em todas as direções do céu.
é chamado de largura natural do estado e o tempo
de vida média deste estado, representando o tempo médio necessário
para o decaimento espontâneo do nível ao estado de mais baixa
energia. Estes parâmetros são conseqüência direta do princípio
da incerteza de Heisenberg, que em termos de energia é escrito como
e identificamos
e
.
As partículas de poeira são suficientemente pequenas
de forma que
espalham (desviam a direção, sem absorver) a luz de menor comprimento de onda (luz azul) mais eficientemente
do que as de maior comprimento de onda (luz vermelha).
De fato, fótons azuis são desviados cerca de 10 vezes mais
eficientemente do que os fótons vermelhos.
Quando um fóton é desviado, sua direção muda
aleatoriamente. Desta maneira, o espalhamento reduz o número
de fótons azuis em relação ao número
de fótons vermelhos do feixe de luz que vem em nossa
direção.
Para fótons no óptico, o espalhamento é
proporcional ao comprimento de onda na potência -4.
Aλ=Ioλ-4
Como resultado, a poeira interestelar faz as estrelas parecerem mais
vermelhas do que realmente são.
Este efeito é similar ao que ocorre na atmosfera da Terra,
onde as moléculas de oxigênio, de poluição
e a poeira desviam a luz azul do Sol, tornando-o mais vermelho ao
pôr-do-sol.
A poeira tem uma temperatura da ordem de 10 a 20K no meio
interestelar, e chega a 100 a 600K em uma Região HII,
que são regiões de gás hidrogênio
ionizado em volta de estrelas quentes e massivas.
As Regiões HII,
nuvens de gás hidrogênio ionizado, ocorrem
principalmente em volta de estrelas O e B pois
estas emitem os fótons ultravioletas com energia acima de 13,6 eV,
isto é, radiação com comprimento de onde menor que 912Å,
tão energética
que, quando os átomos de hidrogênio a absorvem, os elétrons ganham energia
suficiente para se libertarem do núcleo, e o gás fica ionizado.
λmax/(912Å) = T/(32 000K)
Estas regiões portanto têm muitos
íons de hidrogênio (prótons) e elétrons livres. Quando um próton
captura um elétron livre, há emissão de radiação. As linhas do hidrogênio
são emitidas quando o elétron passa, subseqüentemente, pelos vários
níveis de energia. Desta maneira, os fótons ultravioleta da estrela são
degradados em fótons no visível pela região HII. A radiação emitida
quando o elétron passa do nível n=3 para o n=2, em 6563Å, é dominante
e causa a cor vermelha da região.
Foto do centro da Nebulosa de Órion obtida com o Telescópio Espacial Hubble. Esta imagem cobre 2,5 anos-luz da nebulosa. Esta é a região HII mais famosa.
Imagem no visível (esquerda) e no infravermelho da região do Trapézio na
Nebulosa de Órion, obtidas com o Telescópio Espacial Hubble,
mostrando pelo menos 300 estrelas e 50 anãs marrons
em formação e recém formadas. A imagem cobre um ano-luz.
Moléculas Interestelares
As primeiras moléculas interestelares foram descobertas
em 1937 [Pol Swings (1906-1983) & Léon Rosenfeld, 1937, Astrophysical Journal, 86, 483],
na forma de metilidina CH, CH+,
e cianogênio CN. Hidrogênio molecular H2
foi descoberto no início dos anos 1970, junto com monóxido
de carbono CO (2,6 mm, ou 115 gigahertz).
Como o H2 não emite ondas de rádio,
o CO é usado para mapeá-lo. Muitos outros tipos de moléculas
têm sido encontradas desde então, desde amônia
NH3, até as mais
complexas como benzeno C6H6 e acetona
(CH3)2CO e mesmo
com 13 átomos
HC11N cianodecapentano e C70 70-fulereno (Jan Cami, Jeronimo Bernard-Salas, Els Peeters, Sarah Elizabeth Malek, 2010,
Detection of C60 and C70 in a Young Planetary Nebula, Science, 329, 1180).
Baseado principalmente nas observações de CO, nota-se que as
moléculas estão concentradas em nuvens moleculares,
com massas de poucas vezes até um milhão de massas solares,
e se extendem de alguns até cerca de 600 anos-luz. As estrelas se formam
nas partes mais densas destas nuvens moleculares.
Embora o hidrogênio molecular produza linhas no ultravioleta, o gás e
poeira existentes nas nuvens moleculares torna a extinção ultravioleta
muito grande, dificultando a medida do H2. Mas existem
evidências de correlação entre a quantidade de H2 e a de CO,
que pode ser medido em linhas de emissão de rádio em 2,6 e 1,3 mm.
O satélite infravermelho Spitzer encontrou hidrocarbonatos
aromáticos policíclicos em uma nuvem remanescente de supernova,
indicando que mesmo estas explosões energéticas não
conseguem destruir estas moléculas complexas
(Jeonghee Rho, Morten Andersen, A. Tappe, William T. Reach, Jean-Philippe Bernard, John Hewitt,
2011, European Astronomical Society, 46, 169).
Raios Cósmicos
O físico austríaco
Victor Franz Hess (1883-1964) descobriu em 1911-1912 que partículas
carregadas, principalmente prótons, chamadas de raios cósmicos,
altamente energéticas,
atingiam a Terra vindas do espaço. Os raios
cósmicos são produzidos de
alguma forma pelos processos mais energéticos no Universo,
com energias trilhões de vezes maiores do que se pode
obter em nossos laboratórios, e mesmo muito maiores
do que as estrelas podem gerar. As partículas que
constituem os ventos estelares,
que dão origem às auroras na Terra, têm energia muito menor
do que os raios cósmicos. A origem dos
raios cósmicos mais energéticos ainda não é conhecida,
mas explosões de supernovas e núcleos ativos de galáxias,
com buracos negros centrais, são os mais prováveis. Hess,
que fez medidas em balões que alcançaram 5000 metros
de altura, recebeu o
prêmio Nobel de 1936 por sua descoberta.
Ao atingirem a atmosfera da Terra, estas partículas muitas
vezes se desintegram em dezenas de outras partículas,
causando os chuveiros de partículas.
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Modificada em 8 ago 2013