Classificação Massas Formação Colisões Quasares Ativas

Galáxias

A descoberta das galáxias

Por volta do século XVIII vários astrônomos já haviam observado, entre as estrelas, a presença de corpos extensos e difusos, aos quais denominaram "nebulosas". Hoje sabemos que diferentes tipos de objetos estavam agrupados sob esse termo, a maioria pertencendo à nossa própria Galáxia: nuvens de gás iluminadas por estrelas dentro delas, cascas de gás ejectadas por estrelas em estágio final de evolução estelar, aglomerados de estrelas. Mas algumas nebulosas - as nebulosas espirais - eram galáxias individuais, como a nossa Via Láctea.

M86 M91 M92
M86=S0                    M91=SBb                          M92=Irr

Immanuel Kant (1724-1804), o grande filósofo alemão, influenciado pelo astrônomo Thomas Wright (1711-1786), foi o primeiro a propor, por volta de 1755, que algumas nebulosas poderiam ser sistemas estelares totalmente comparáveis à nossa Galáxia. Citando Kant: "[A] analogia [das nebulosas] com o sistema estelar em que vivemos... está em perfeita concordância com o conceito de que esses objetos elípticos são simplesmente universos [ilha], em outras palavras, Vias Lácteas ...". Essa idéia ficou conhecia como a "hipótese dos universos-ilha". No entanto, as especulações cosmológicas de Kant não foram bem aceitas na época, de forma que a natureza das nebulosas permaneceu assunto de controvérsia.

Até 1908, cerca de 15 000 nebulosas haviam sido catalogadas e descritas. Algumas haviam sido corretamente identificadas como aglomerados estelares, e outras como nebulosas gasosas. A maioria, porém, permanecia com natureza inexplicada.

Messier
O catálogo de objetos difusos de Charles Messier (1758-1782) [Fonte: The SEDS Messier Catalog Webpages].
O problema maior era que a distância a elas não era conhecida, portanto não era possível saber se elas pertenciam à nossa Galáxia ou não.

ShapleyShapley CurtisCurtis
Dois dos maiores protagonistas nessa controvérsia foram Harlow Shapley (1885-1972), do Mount Wilson Observatory, e Heber Doust Curtis (1872-1942), do Lick Observatory, ambos nos Estados Unidos. Shapley defendia que as nebulosas espirais eram objetos da nossa Galáxia, e Curtis defendia a idéia oposta, de que eram objetos extragalácticos. A discussão culminou num famoso debate em abril de 1920, frente à Academia Nacional de Ciências. Mas o debate não resolveu a questão.
Hubble Somente em 1923 Edwin Powell Hubble (1889-1953) proporcionou a evidência definitiva para considerar as "nebulosas espirais" como galáxias independentes, ao identificar uma variável Cefeida na "nebulosa" de Andrômeda (M31).
M31
Montagem da foto da galáxia Andrômeda, M31, que tem B=3,4, declinação de +41° e está a 2,5 milhões de anos-luz (765 kpc) de nós, 190'×60', 47 kpc de diâmetro isofotal, vr=-300 km/s, z=-0.001, com a imagem da Lua na mesma escala, mas a Lua é 1,5 milhão de vezes mais brilhante (15,5 magnitudes). A Lua não passa próxima da posição da galáxia no céu. A galáxia M 110, sua satélite, está na parte inferior. ©Adam Block e Tim Puckett. O primeiro registro conhecido da galáxia é do ano 905 d.C., pelo astrônomo persa Abd Al-Rahman Al Sufi (903-986).
A partir da relação conhecida entre período e luminosidade das Cefeidas da nossa Galáxia, e do brilho aparente das Cefeidas de Andrômeda, Hubble pode calcular a distância entre esta e a Via Láctea, obtendo um valor de 2,2 milhões de anos-luz. Isso situava Andrômeda bem além dos limites da nossa Galáxia, que tem 100 mil anos-luz de diâmetro. Ficou assim provado que Andrômeda era um sistema estelar independente.
Cefeida
Uma cefeida na galáxia IC 4182, (m-M) = 28.36 ± 0.09, d=4.7 Mpc, observada pelo Telescópio Espacial Hubble

Em 1951, o astrônomo alemão Wilhelm Heinrich Walter Baade (1893-1960), trabalhando com os grandes telescópios de Mount Wilson e o 5 metros do Observatório Palomar, nos Estados Unidos, pode medir a distância de centenas de galáxias fora do Grupo Local, mostrando que a Via Láctea e o Grupo Local são objetos normais em um Universo muito maior, sem qualquer posição de destaque (Galaxies - Present Day Problems, Publications of the Observatory of Michigan, Vol. 10, p. 7).

Classificação morfológica de galáxias

As galáxias diferem bastante entre si, mas a grande maioria têm formas mais ou menos regulares quando observadas em projeção contra o céu, e se enquadram em duas classes gerais: espirais e elípticas. Algumas galáxias não têm forma definida, e são chamadas irregulares. Atualmente se sabe que as galáxias nascem nas regiões de maior condensação da matéria escura. A distribuição destas condensações é aleatória. Se há assimetria na distribuição das condensações em uma região do espaço, a força de maré produzida pela assimetria gera momentum angular na nuvem, e uma galáxia espiral se forma. Se a distribuição local é simétrica, não haverá momentum angular líquido, e uma galáxia elíptica se forma.

Um dos primeiros e mais simples esquemas de classificação de galáxias, que é usado até hoje, aparece no livro de 1936 de Edwin Hubble, The Realm of the Nebulae, baseado no esquema proposto por John Henry Reynolds (1874-1949) em 1920 (Photometric measures of the nuclei of some typical spiral nebulae, Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, 80, 746). O esquema de Hubble consiste de três sequências principais de classificação: elípticas, espirais e espirais barradas. Nesse esquema, as galáxias irregulares formam uma quarta classe de objetos.

Classificao
Esquema de Hubble para a classificação de galáxias.

Espirais (S)

As galáxias espirais, quando vistas de frente, apresentam uma clara estrutura espiral. Andrômeda (M 31) e a nossa própria Galáxia são espirais típicas. Elas possuem um núcleo, um disco, um halo, e braços espirais. As galáxias espirais apresentam diferenças entre si principalmente quanto ao tamanho do núcleo e ao grau de desenvolvimento dos braços espirais. Assim, elas são subdivididas nas categorias Sa, Sb e Sc, de acordo com o grau de desenvolvimento e enrolamento dos braços espirais e com o tamanho do núcleo comparado com o do disco

a núcleo maior, braços pequenos e bem enrolados
b núcleo e braços intermediários
c núcleo menor, braços grandes e mais abertos
Por exemplo, uma galáxia Sa é uma espiral com núcleo grande e braços espirais pequenos, bem enrolados, de difícil resolução.
espirais
Fotos de galáxias obtidas por Jim Wray, no McDonald Observatory.

Existem algumas galáxias que têm núcleo, disco e halo, mas não têm traços de estrutura espiral. Hubble classificou essas galáxias como S0, e elas são às vezes chamadas lenticulares. As galáxias espirais e lenticulares juntas formam o conjunto das galáxias discoidais.

S0

Mais ou menos metade de todas as galáxias discoidais apresentam uma estrutura em forma de barra atravessando o núcleo. Elas são chamadas barradas e, na classificação de Hubble elas são identificadas pelas iniciais SB. As galáxias barradas também se subdividem nas categoria SB0, SBa, SBb, e SBc. Nas espirais barradas, os braços normalmente partem das extremidades da barra. O fenômeno de formação da barra ainda não é bem compreendido, mas acredita-se que a barra seja a resposta do sistema a um tipo de perturbação gravitacional periódica (como uma galáxia companheira), ou simplesmente a consequência de uma assimetria na distribuição de massa no disco da galáxia. Alguns astrônomos também acreditam que a barra seja pelo menos em parte responsável pela formação da estrutura espiral, assim como por outros fenômenos evolutivos em galáxias.

barradas

Normalmente se observa, nos braços das galáxias espirais, o material interestelar. Ali também estão presentes as nebulosas gasosas, poeira, e estrelas jovens, incluindo as super-gigantes luminosas. Os aglomerados estelares abertos podem ser vistos nos braços das espirais mais próximas e os aglomerados globulares no halo. A população estelar típica das galáxias espirais está formada por estrelas jovens e velhas.

As galáxias espirais têm diâmetros que variam de 20 mil anos-luz até mais de 100 mil anos-luz. Estima-se que suas massas variam de 10 bilhões a 10 trilhões de vezes a massa do Sol. Nossa Galáxia e M 31 são ambas espirais grandes e massivas.

M83M83
NGC1365NGC1365
Exemplos de galáxias espirais e espirais barradas.

Elípticas (E)

As galáxias elípticas apresentam forma esférica ou elipsoidal, e não têm estrutura espiral. Têm pouco gás, pouca poeira e poucas estrelas jovens. Elas se parecem ao núcleo e halo das galáxias espirais.

elipticas
As galáxias elípticas são chamadas de En, onde n=10(a-b)/a, sendo a o semi-eixo maior e b o semi-eixo menor.

Hubble subdividiu as elípticas em classes de E0 a E7, de acordo com o seu grau de achatamento. Imagine-se olhando um prato circular de frente: essa é a aparência de uma galáxia E0. Agora vá inclinando o prato de forma que ele pareça cada vez mais elíptico e menos circular: esse achatamento gradativo representa a sequência de E0 a E7. Note que Hubble baseou sua classificação na aparência da galáxia, não na sua verdadeira forma. Por exemplo, uma galáxia E0 tanto pode ser uma elíptica realmente esférica quanto pode ser uma elíptica mais achatada vista de frente, já uma E7 tem que ser uma elíptica achatada vista de perfil. Porém nenhuma elíptica jamais vai aparecer tão achatada quanto uma espiral vista de perfil.

As galáxias elípticas variam muito de tamanho, desde super-gigantes até anãs. As maiores elípticas têm diâmetros de milhões de anos-luz, ao passo que as menores têm somente poucos milhares de anos-luz em diâmetro. As elípticas gigantes, que têm massas de até 10 trilhões de massas solares, são raras, mas as elípticas anãs são o tipo mais comum de galáxias.

M87  Messier87
A galáxia elíptica gigante M 87, também chamada de Virgo A, a uma distância de 53 milhões de anos-luz, com seu jato relativístico no infravermelho com 20"×2", correspodendo a 5 mil anos-luz.

Irregulares (I)

Hubble classificou como galáxias irregulares aquelas que não tem qualquer simetria circular ou rotacional, apresentando uma estrutura caótica ou irregular. Muitas irregulares parecem ter atividade de formação estelar relativamente intensa, com aparência dominada por estrelas jovens brilhantes e nuvens de gás ionizado distribuídas irregularmente. Em contraste, observações na linha de 21 cm, que revela a distribuição do gás hidrogênio, mostra a existência de um disco de gás similar ao das galáxias espirais. As galáxias irregulares também lembram as espirais no seu conteúdo estelar, que inclui estrelas de população I e II (jovens e velhas).

Os dois exemplos mais conhecidos de galáxias irregulares são a Grande e a Pequena Nuvens de Magalhães, as galáxias vizinhas mais próximas da Via Láctea, visíveis a olho nu no Hemisfério Sul. Foram identificadas pelo navegador português Fernão de Magalhães (1480-1521), em 1519, mas incluídas em 964 no Livro de Estrelas Fixas, de Abd-al-Rahman Al Sufi. A Grande Nuvem, com diâmetro aparente de 650'×550', V=0,1, tem uma barra, embora não tenha braços espirais. Aparentemente ela orbita a Via Láctea, com velocidade de 387 km/s. Nela está presente o complexo 30 Doradus, com o aglomerado R136, um dos maiores e mais luminosos agrupamentos de gás e estrelas super-gigantes conhecido em qualquer galáxia. A Supernova 1987A ocorreu perto de 30 Doradus. A massa da Grande Nuvem é da ordem de 6 bilhões de massas solares, e sua distância da ordem de 163 mil anos-luz., com módulo de distância de 18,47. A Pequena Nuvem de Magalhães, com 320'×185', V=2,3, v=158nbsp;km/s, diâmetro isofotal de 6 kpc, tem módulo de distância de 18,89, está a 199 mil anos-luz, na constelação Tucana.

GNM
A Grande Nuvem de Magalhães, uma galáxia irregular. A mancha vermelha à esquerda é a região de formação estelar gigante 30 Doradus. Foto por Wei-Hao Wang.
A Pequena Nuvem é bastante alongada e menos massiva do que a Grande Nuvem. Aparentemente é o resultado de uma colisão com a Grande Nuvem acontecida há uns 200 milhões de anos atrás.
LMC e SMC
Foto das galáxias irregulares Grande Nuvem de Magalhães e Pequena Nuvem de Magalhães, obtida por Wei-Hao Wang.
Propriedade Espirais Elípticas Irregulares
Massa (M) 109 a 1012 105 a 1013 108 a 1011
Diâmetro (kpc)> 5 - 30 1 - 1000 1 - 10
Luminosidade (L) 108 a 1011 106 a 1012 107 a 2 × 109
População estelar Velha e jovem Velha Velha e jovem
Tipo espectral A a K G a K A a F
Gás Bastante Muito pouco Bastante
Poeira Bastante Muito pouca Varia
Cor Azulada no disco Amarelada Azulada
  Amarelada no bojo    
Estrelas mais velhas 1010 anos 1010 anos 1010 anos
Estrelas mais jovens Recentes 1010 anos Recentes

Principais características dos diferentes tipos de galáxias
As galáxias elípticas foram formadas de nuvens com baixo momentum angular, enquanto as espirais de nuvens com alto momentum angular. Como a rotação inibe a formação estelar pois dificulta a condensação da nuvem, as estrelas se formam mais lentamente nas galáxias espirais, permitindo que o gás perdure e a formação estelar se estenda até o presente.

Massas de galáxias

Assim como a massa de uma estrela é a sua característica física mais importante, também nas galáxias a massa tem um papel crucial, não apenas em sua evolução como sistemas individuais, mas na evolução do próprio Universo. Por exemplo, da quantidade de massa das galáxias depende a densidade de matéria visível do Universo.

A melhor maneira de medir a massa é a partir das velocidades das estrelas devido à atração gravitacional entre elas. Em galáxias elípticas, as velocidades medidas são velocidades médias, pois os movimentos das estrelas nesses sistemas têm componentes de mesma magnitude nas três direções, e todas seguem órbitas bastante elípticas.

Massas de galáxias elípticas

Eorbits
As massas das galáxias elípticas podem ser determinadas a partir do Teorema do Virial, segundo o qual num sistema estacionário (cujas propriedades não variam no tempo), a soma da energia potencial gravitacional das partículas e o dobro de sua energia cinética, é nula, ou seja:
E_G + 2E_C = 0
onde $ E_G$ é a energia potencial gravitacional e $ E_C$ é a energia cinética.

Podemos considerar uma galáxia como um sistema estacionário (pois ela não está nem se contraindo nem se expandindo), cujas partículas são as estrelas.

A energia cinética das estrelas na galáxia pode ser escrita como:

E_C = \frac{Mv^2}{2}
onde M é a massa total da galáxia e v é a velocidade média das estrelas, medida pelo alargamento das linhas espectrais 1.

A energia potencial gravitacional é

E_G = -\frac{GM^2}{2R}
onde R é um raio médio da galáxia que pode ser estimado a partir da distribuição de luz. Combinando as três equações acima achamos que
{M^{elipticas} = \frac{2v^2\,R}{G}}
Esse mesmo método pode ser usado também para calcular as massas de aglomerados de galáxias, assumindo que eles são estacionários. Nesse caso, consideraremos cada galáxia como uma partícula do sistema. A energia cinética pode ser calculada pelos deslocamentos das linhas espectrais, e a energia potencial gravitacional pela separação média das galáxias do aglomerado.

Massas de galáxias espirais

As galáxias espirais têm grande parte das estrelas confinadas ao plano do disco, com órbitas quase circulares, e velocidades que dependem da distância ao centro.
Sporbits
Curva de rotação para a galáxia espiral NGC3198.
rotation
Em galáxias espirais, nas quais o movimento circular das estrelas no disco é dominante sobre o movimento desordenado das estrelas do bojo, a massa pode ser determinada através da curva de rotação, v(R), que é um gráfico da velocidade de rotação em função da distância galactocêntrica. As velocidades de rotação em cada ponto são obtidas medindo o deslocamento Doppler das linhas espectrais.

Assumindo que a maior parte da massa da galáxia está no bojo interno, e que portanto o movimento rotacional das estrelas no disco é determinado pela massa do bojo, podemos determinar essa massa através da igualdade da força gravitacional com a força centrífuga, da mesma maneira como determinamos a massa da nossa Galáxia.

$F_G=F_c \rightarrow \frac{GM_Gm}{R^2} = \frac{mv^2}{R} \rightarrow
M_G = \frac{Rv^2}{G}$
Chamando M(R) a massa interna ao raio R, temos que
{M(R)^{espirais} = \frac{R[v(R)]^2}{G}}
Nas partes externas de muitas espirais, a velocidade v(R) não depende mais de R, ou seja, v(r) permanece constante, de forma que quanto maior o raio R, maior a massa M(R) interna a ele. Como as partes externas das galáxias são muito fracas, a partir de um certo valor de R a luminosidade não aumenta mais, mas de acordo com a curva de rotação a massa continua crescendo. Isso significa que uma grande parte da massa das galáxias deve ser não luminosa, e é conhecido como o problema da massa escura.

A formação e evolução das galáxias

Qual a causa de existirem diferentes tipos de galáxia? Quando os primeiros estudos sobre galáxias iniciaram, o fato de as galáxia elípticas terem a maioria das estrelas mais velhas do que as galáxias espirais levou os astrônomos a pensarem que as diferenças se deviam à evolução, ou seja, as galáxias quando jovens seriam espirais e mais tarde evoluiriam a elípticas.

Entretanto, se determinarmos as idades das estrelas mais velhas em sistemas espirais e em sistemas elípticos, encontramos que em todos os tipos de galáxias, as estrelas mais velhas são igualmente velhas, em torno de 11 bilhões de anos. Portanto, todas as galáxias que vemos começaram a se formar mais ou menos na mesma época na história do Universo, e têm a mesma idade. A diferença é que nas espirais e nas irregulares sobrou gás suficiente para continuar o processo de formação estelar até a época presente.

DeepField
Imagem de longa exposição do telescópio Espacial Hubble, mostrando que todos os tipos de galáxias já eram encontradas no passado remoto.

Uma diferença importante entre elípticas e espirais é a velocidade com que ocorre a formação estelar. Nas elípticas a formação estelar aconteceu de forma mais rápida no início de sua evolução, talvez porque tenham se originado de nuvens protogalácticas mais densas do que as espirais. Da mesma forma, nas regiões centrais das espirais, onde a densidade era maior, a formação estelar foi rápida, mas nos braços se procedeu mais lentamente, de forma que o gás não foi consumido todo de uma vez, e a formação estelar pode continuar.

Outro fator importante é a quantidade de momentum angular (quantidade de rotação) da nuvem de gás primordial: quanto mais momentum angular a nuvem tinha inicialmente, mais achatada será a forma final. Levando isso em conta, as elípticas teriam se formado de nuvens que tinham pouca rotação quando começaram a se contrair, ao passo que as espirais teriam se formado do colapso de nuvens com mais rotação.

Qual a causa de existirem diferentes tipos de galáxia? As estrelas mais velhas das galáxias espirais são tão velhas quanto as estrelas mais velhas das galáxias elípticas e, portanto, os dois tipos devem ter sido formados à mesma época, quando o Universo tinha cerca de 1 bilhão de anos. Por alguma razão - possivelmente a quantidade de momemtum angular induzida na nuvem pela distribuição aleatória das condensações na radiação de fundo do Universo, refletida na distribuição da matéria escura - as galáxias elípticas formaram todas as suas estrelas em um breve surto, quando elas eram muito jovens, consumindo a maior parte de seu gás, enquanto que nas galáxias espirais a formação estelar ocorreu de forma mais lenta desde o início, preservando parte do gás e continuando a geração de novas estrelas por bilhões de anos.

HST Galaxias
Galáxias em formação no Universo jovem. O objeto marcado com o número 2 está ampliado no canto superior esquerdo da figura, mostrando tratar-se de duas pequenas galáxias se juntando para formar uma galáxia maior. O deslocamento para o vermelho (redshift) desse objeto é z=Δλ/λ=4,88, indicando que sua idade é menos da metade da idade atual do Universo. [Crédito: NASA, ESA e N. Pirzkal STScI/ESA) et al.]

Na segunda metade do século passado surgiram as duas teorias principais sobre formação e evolução de galáxias: o modelo monolítico propõe que as galáxias se formaram e evoluíram isoladamente pelo colapso de grandes nuvens de gás; o modelo hierárquico propõe que as galáxias se formaram e evoluiram através de encontros sucessivos de nuvens menores. Ambas as teorias assumem que as nuvens de gás que deram origem às galaxias se formaram pela condensação de matéria em certas regiões do espaço devido às flutuações de densidade existentes no Universo primordial.

No modelo monolítico, a forma das galáxias seria determinada pela rapidez com que aconteceu a formação estelar (taxa de formação estelar) na nuvem em contração, e pela quantidade de rotação (momentum angular) da nuvem. Em nuvens de baixa rotação, a taxa de formação estelar era alta, praticamente todo o gás foi consumido rapidamente e a galáxia resultante é uma elíptica, de forma ovalada e com pouco gás para dar origem a novas estrelas. Em nuvens com alta rotação, a taxa de formação estelar é baixa, parte do gás se deposita em um disco, como consequencia da rotação da nuvem. A galáxia resultante então é uma espiral, com gás suficiente para manter formação estelar até a época atual.

No modelo hierárquico, as pequenas nuvens de gás em contração dariam origem preferencialmente a sistemas puramente discoidais, que evoluiriam a galáxias espirais, se sofressem poucas interações entre si, ou a elípticas, no caso de os encontros e fusões serem muito frequentes. Neste modelo, o o fator determinante para a evolução da galáxia é o meio em que ela se encontra.

Nos últimos 20 anos, o uso de telescópios modernos, que permitem estudar galáxias a grandes distâncias, têm fornecido vários vínculos observacionais para o estudo da evolução das galáxias. Observando galáxias remotas, os astrônomos constataram que que no passado havia um grande número de galáxias pequenas, irregulares e com uma taxa muito alta de formação estelar, que não existem no Universo atual, sugerindo que muitas se fundiram posteriormente dando origem a galáxias maiores, como a galáxia indicada pelo número 2 na figura acima.

Outra observação importante é a de que galáxias espirais são raras em aglomerados densos de galáxias, onde as galáxias elípticas predominam. Essas observações em geral favorecem o modelo hierárquico, pois evidenciam que as estruturas menores se formaram antes das maiores, e que o meio tem influência sobre a evolução das galáxias, pois interações e colisões podem alterar suas morfologias. No entanto, existem contradições, como as indicações de que todas as estrelas de elipticas em uma dada distância (redshift) têm idades similares, o que seriam melhor explicado pelo colapso monolítico, e não por mergers sucessivos.

Portanto, no momento não existe uma teoria que dê conta de todos os aspectos observacionais para explicar como as galáxias se formaram e evoluíram até o presente, muito menos uma teoria que possa prever sua evolução futura. Provavelmente acontece tanto a formação monolítica, em galáxias isoladas, quanto a hierárquica, em aglomerados de galáxias.

Aglomerados de galáxias

Olhando-se fotografias do céu, nota-se facilmente que as galáxias tendem a existir em grupos.

Hydra Grupo Local
Foto do Aglomerado de Hydra e desenho do Grupo Local
Jan Hendrik Oort (1900-1992) demonstrou que as galáxias não estão distribuídas aleatoriamente no espaço, mas concentram-se em grupos, como o Grupo Local, que contém cerca de 80 galáxias, e grande cúmulos, como o grande cúmulo de Virgem, que contém 2500 galáxias. Oort demonstrou também que as 2500 galáxias do cúmulo de Virgem, movendo-se a 750 km/s, são insuficientes por um fator de 100 para manter o cúmulo gravitacionalmente estável, indicando novamente que a matéria escura deve ser dominante. Recentemente a detecção pela emissão de raio-X dos gás quente no meio entre as galáxias dos cúmulos indica que um terço da matéria originalmente chamada de escura é na verdade gás quente. Mas pelo menos dois terços da matéria escura não pode ser bariônica, ou a quantidade de hélio e deutério do Universo teria que ser diferente da observada, como explicitado no capítulo de Cosmologia.

abell2218
Imagem de lentes gravitacionais no cúmulo Abell 2218, fotografado pelo Telescópio Espacial Hubble.


O Grupo Local

O grupo de galáxias ao qual a Via Láctea pertence chama-se Grupo Local. É um aglomerado pequeno, com cerca de 80 membros, que ocupa um volume de 3 milhões de anos-luz na sua dimensão maior. A Via Láctea e Andrômeda (M31) são de longe os dois membros mais massivos, estando um em cada borda do aglomerado. A terceira galáxia mais luminosa do grupo é outra espiral, M33, que tem 20% da luminosidade da Via Láctea e 13% da luminosidade de Andrômeda. Entre os demais membros existem duas elípticas, M32, satélite de M31, e M110, e várias irregulares e galáxias anãs.
As Nuvens de Magalhães (Grande Nuvem de Magalhães e Pequena Nuvem de Magalhães), galáxias irregulares satélites da nossa Galáxia , também fazem parte desse grupo. A Grande Nuvem de Magalhães, localizada a 150 mil anos-luz (46 kpc) da Via Láctea, era até 1994 considerada a galáxia mais próxima2. Desde 2003 foram descobertas várias galáxias anãs na região do Grupo Local, entre as quais a Anã do Cão Maior, uma anã localizada a apenas 25 mil anos-luz de distãncia, na direção do centro galáctico. Essa é atualmente a galáxia mais próxima, e só não foi detectada antes devido a estar numa região de grande extinção e ter brilho superficial muito baixo.
No total, o grupo local contém pelo menos 3 galáxias espirais, 1 elíptica, 15 galáxias irregulares de diferentes tamanhos, e 2 anãs elípticas, e 59 anãs esferoidais. A maioria das galáxias se encontram orbitando a Via Láctea ou Andrômeda, dando uma aparência binária ao Grupo Local.

Outros aglomerados de galáxias

Virgo
Fotografia de parte do cúmulo de Virgem. O cúmulo contém mais de 2500 galáxias e cobre mais de 5° no céu. A galáxia elíptica brilhante M84 é a que está logo acima do centro e M86 é a elíptica brilhante à direita.
Outros aglomerados de galáxias variam de grupos pequenos a aglomerados compactos. O aglomerado de Fornax, relativamente próximo, apresenta um conjunto variado de tipos de galáxias, embora tenha poucos membros.
O grande aglomerado de Coma cobre 20 milhões de anos-luz no espaço (2 graus de diâmetro) e contém milhares de membros. O aglomerado de Virgem tem no centro as galáxias elípticas gigantes M84 e M86, situadas a uma distância de 34 milhões de anos-luz. Ele também cobre 20 milhões de anos-luz no espaço e é um dos mais espetaculares do céu. Suas quatro galáxias mais brilhantes são galáxias elípticas gigantes, embora a maior parte das galáxias membros visíveis sejam espirais.
Coma
Aglomerado de Coma: quase todo objeto visto nesta foto é uma galáxia do aglomerado.
O aglomerado de Virgem é tão massivo e tão próximo que influencia gravitacionalmente o Grupo Local, fazendo com que nos movamos na sua direção. A galáxia elíptica gigante M87, também do aglomerado, contém um buraco-negro massivo em seu centro, com massa de 1,3 bilhões de massas solares.

M87Jato M87 EHT
A galáxia elíptica gigante M87, do aglomerado de Virgem, a 53 milhões de anos-luz da Terra, fotografada pelo Hubble Space Telescope. A galáxia está muito distante mesmo para o telescópio espacial detectar estrelas individuais. As formas puntuais são cúmulos (aglomerados) estelares. O jato de elétrons relativísticos é acelerado pelo buraco negro massivo central. A denominação M das galáxias vem de Charles Messier (1730-1817), um buscador de cometas, que em 1781 registrou a posição de 103 objetos extensos (nebulosas) para não confundí-los com cometas. A imagem da direita mostra o buraco negro central em luz polarizada, obtida pelo Event Horizon Telescope.

Fornax
Imagem do centro do aglomerado de galáxias do Fornax, a 15 Mpc de distância e RA=3h 36m, DEC=-35°37m, obtida pela VISTA/ESO, cobrindo 1°×1,5° do céu. No centro do aglomerado está a galáxia elíptica tipo E1 NGC 1399. Abaixo desta a E1 NGC 1404 e a esquerda desta a irregular NGC 1427.
JWST MIRI
Imagem do quinteto de Stephan obtida com o Mid Infrered Imager do James Webb Space Telescope. A gálaxia no topo, NGC 7319, tem no centro um núcleo ativo, com um buraco negro com 24 milhões de massas solares, acretando material. Somente as quatro da direita formam um grupo verdadeiro, NGC 7317, NGC 7318A, NGC 7318B e NGC 7319m a cerca de 290 milhões de anos-luz de distância.. A quinta, mais a esquerda, NGC 730 está a 40 milhões de anos luz.

Superaglomerados

Depois de descobrir que as galáxias faziam partes de aglomerados ou cúmulos de galáxias, os astrônomos se perguntaram se existiam estruturas ainda maiores no Universo. Em 1953, o astrônomo francês Gérard de Vaucouleurs (1918-1995) demonstrou que os aglomerados de galáxias também formam superaglomerados.

O superaglomerado mais bem estudado é o Superaglomerado Local, ou Superaglomerado de Virgem, porque fazemos parte dele. Ele tem um diâmetro de aproximadamente 100 milhões de anos-luz e aproximadamente 1015 massas solares, contendo o Grupo Local de galáxias, e o Aglomerado de Virgem.

Estrutura em Grande Escala

Entre estes superaglomerados observam-se grandes regiões sem galáxias, mas onde foram detectadas nuvens de hidrogênio neutro. Margaret J. Geller (1947-) e John Peter Huchra (1948-2010), do Center for Astrophysics da Universidade de Harvard, e os brasileiros Luiz Alberto Nicolaci da Costa (1950-) e Paulo Sergio de Souza Pellegrini (1949-), do Observatório Nacional, estudaram a distribuição de galáxias em grande escala, mostrando que as galáxias não estão distribuídas uniformemente, mas formam filamentos no espaço. Um exemplo destes filamentos é a Grande Parede (Great Wall), um concentração de galáxias que se estende por cerca de 500 milhões de anos-luz de comprimento, 200 milhões de anos-luz de altura, mas somente 15 milhões de anos-luz de espessura. Esta estrutura está a uma distância média de 250 milhões de anos-luz da nossa Galáxia, e tem uma massa da ordem de 2×1016 M. Entre estes filamentos estão regiões, de diâmetros de 150 milhões de anos-luz, quase sem galáxias. A estrutura lembra um esponja. Atualmente se sabe por simulações cosmológicas que cerca de 50% da massa do Universo está nos filamentos, e que o acréscimo de massa na galáxias e nos aglomerados de galáxias ocorre principalmente pelos filamentos (Marius Cautun, Rien van de Weygaert, Bernard J. T. Jones; Carlos S. Frenk, 2014, Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, 441, 2923). O Sloan Digital Sky Survey continua este mapeamento.
Distribuição de galáxias no espaço, conforme observações de Margaret Geller e John Huchra. Cada ponto nesta figura representa uma das 9325 galáxias, na direção do pólos sul e norte da nossa galáxia. Nossa galáxia está no centro da figura, onde as duas partes se unem; as regiões não mapeadas são obscurecidas pelo disco da nossa galáxia. A Grande Parede é a banda de galáxias que se estende de lado a lado quase no meio da parte superior da figura.
wall1.epsf
3D
6df
Distribuição espacial de 100 mil galáxias próximas determidado pela Busca de Galáxias 6df, na Austrália. Cada galáxia é representada por um ponto. Nossa Galáxia está no centro da distribuição e a faixa onde não foram observadas galáxias indica o disco de nossa Galáxia, que obscurece a busca (Chris Fluke, Centre for Astrophysics and Supercomputing, Swinburne University of Technology).

Colisões entre galáxias

Galáxias em aglomerados estão relativamente próximas umas das outras, isto é, as separações entre elas não são grandes comparadas com seus tamanhos (o espaçamento entre as galáxias é da ordem de apenas cem vezes o seu tamanho, enquanto a distância média entre as estrelas é da ordem de 1 parsec = 22 milhões de diâmetros solares. Isso significa que provavelmente essas galáxias estão em frequentes interações umas com as outras.
Tadpole Imagem do Telescópio Espacial Hubble da galáxia do girino (tadpole).
Nos catálogos existentes de galáxias peculiares há muitos exemplos de pares de galáxias com aparências estranhas que parecem estar interagindo uma com a outra. Podemos entender muitos desses casos em termos de efeitos de maré gravitacional, que tendem a esticar os objetos na direção de aproximação. Os efeitos de marés entre pares de galáxias que passam perto uma da outra foram estudados pelos irmãos estonianos Alar (1937-) e Juri (1937-) Toomre (1972, Galactic Bridges and Tails, Astrophysical Journal, 178, 623; 1973, Violent tides between galaxies, Scientific American, 229, 38). Eles assinalaram três propriedades fundamentais nas interações por maré:
  1. a força de maré é proporcional ao inverso do cubo da separação entre as galáxias;
  2. as forças de maré sobre um objeto tende a alongá-lo; assim, os bojos de maré se formam no lado mais próximo e no lado mais distante de cada galáxia em relação à outra;
  3. as galáxias perturbadas geralmente giravam antes do encontro de maré e a distribuição posterior de seu material deve portanto refletir a conservação de seu momentum angular.

Como um primeiro resultado, é de se esperar que uma interacção de maré entre duas galáxias puxe matéria de uma em direção à outra. Essas "pontes" de matéria realmente se formam entre as galáxias interagentes, mas também se formam caudas de matéria que saem de cada galáxia na direção oposta à outra. Devido à rotação das galáxias, as caudas e pontes podem assumir formas esquisitas, especialmente se levarmos em conta o fato de que os movimentos orbitais das galáxias estarão em um plano que forma um ângulo qualquer com a nossa linha de visada. Os irmãos Toomre têm conseguido calcular modelos de galáxias interagentes que simulam a aparência de diversos pares de galáxias com formas estranhas, vistas realmente no céu.

NGC4038 colisao
NGC 4038/9: um exemplo clássico de galáxias em colisão.
Anel Roda
Modelo calculado por Alar Toomre para uma colisão frontal entre duas galáxias, formando uma galáxia com anel, e uma foto obtida com Telescópio Espacial Hubble da galáxia da roda.
M81 tres
Imagem em 21 cm de M 81, a mais brilhante, M 82 e NGC 3077, e um modelo de interação de sua formação, obtidos por Min Yun, do National Radio Astronomy Observatory.

Fusão de galáxias e canibalismo galáctico

Se as galáxias colidem com velocidade relativamente baixa, elas podem evitar a disrupção por maré. Os cálculos mostram que algumas partes das galáxias que colidem podem ser ejectadas, enquanto as massas principais se convertem em sistemas binários (ou múltiplos) com pequenas órbitas ao redor uma da outra. O sistema binário recentemente formado encontra-se envolto em um envelope de estrelas e possivelmente matéria interestelar, e eventualmente pode se fundir formando uma única galáxia. Esse processo é especialmente provável nas colisões entre os membros mais massivos de um aglomerado de galáxias, que tendem a ter velocidades relativamente mais baixas. A fusão pode converter galáxias espirais em elípticas.

O termo fusão de galáxias é usado em referência à interacção entre galáxias de tamanhos semelhantes. Quando uma galáxia muito grande interage com outra muito menor, as forças de maré da galáxia maior podem ser tão fortes a ponto de destruir a estrutura da galáxia menor cujos pedaços serão então incorporados pela maior. Astrônomos chamam este processo de canibalismo galáctico.

Observações recentes mostram que galáxias elípticas gigantes, conhecidas como galáxias cD, têm propriedades peculiares, tais como: halos muito extensos (até 3 milhões de anos luz em diâmetro), núcleos múltiplos, e localização em centros de aglomerados. Essas propriedades sugerem que essas galáxias se formaram por canibalismo galáctico.

Muitas vezes, o encontro entre as galáxias não é forte o suficiente para resultar em fusão. Numa interacção mais fraca, ambas as galáxias sobrevivem, mas o efeito de maré pode fazer surgirem caudas de matéria, em um ou ambos lados das duas galáxias. Muitas galáxias com aparências estranhas, que não se enquadram em nenhuma das categorias de Hubble, mostram evidências de interações recentes. Simulações por computador mostram que sua forma pode ser reproduzida por interacção de maré, em colisões. Um resultado recente de simulações em computador é a possibilidade de que colisões possam transformar galáxias espirais em elípticas: a interacção pode retirar gás, estrelas e poeira das duas galáxias, transformando-as em uma elíptica. A colisão pode também direcionar grande quantidade de gás ao centro da elíptica resultante, propiciando a criação de um buraco negro.

Quasares

Imagem no ótico do quasar 3C 279, obtida com o Canada-France-Hawaii Telescope de 3,6 m de diâmetro. O quasar tem magnitude aparente V=17,75 e magnitude absoluta estimada de MV=-24,6 (uma estrela O5V tem MV=-5). O nome vem do fato de ser o objeto número 279 do terceiro catálogo de rádio fontes de Cambridge. Pelo módulo de distância, r=2,951 Gpc.
3c279.epsf
Os quasares, cujo nome vem de Quasi Stellar Radio Sources, foram descobertos em 1960, como fortes fontes de rádio, com aparência ótica aproximadamente estelar, azuladas. 3C 48 foi a primeira fonte do Third Cambridge Catalogue of Radio Sources identificada óticamente por Allan Rex Sandage (1926-2010) e Thomas Matthews in 1960, através de interferometria (1963, Optical Identification of 3c 48, 3c 196, and 3c 286 with Stellar Objects, Astrophysical Journal, 138, 30). Muito provavelmente são galáxias com buracos negros fortemente ativos no centro, como proposto em 1964 por Edwin Ernest Salpeter (1925-2008) e Yakov Borisovich Zel'dovich (1914-1989). São objetos extremamente compactos e luminosos, emitindo mais do que centenas de galáxias juntas, isto é, até um trilhão de vezes mais do que o Sol. São fortes fontes de rádio, variáveis, e seus espectros apresentam linhas largas com efeito Doppler indicando que eles estão se afastando a velocidades muito altas, de até alguns décimos da velocidade da luz. O primeiro a ter seu espectro identificado foi 3C 273, pelo astronomo holandêz Maarten Schmidt (1929-2022), em 1963 (3C 273: a star-like object with large red-shift, Nature, 197, 1040). Maarten foi orientando de Oort, em Leiden, em 1956. Este quasar tem magnitude aparente V=12,85, mas magnitude absoluta estimada de MV=-26,9. Pelo módulo de distância, r=891 Mpc.
redshift
O espectro do quasar 3C 273 no ótico e infravermelho próximo é dominado pelas linhas do hidrogênio em emissão e deslocadas para o vermelho (redshifted) por efeito Doppler. Por exemplo, a linha Hβ está deslocada de 4861Å para 5630Å.
quasar.epsf
Modelo de um quasar, com um buraco negro no centro, um disco de acresção em volta deste, e jatos polares.
No modelo mais aceito, o buraco negro central acreta gás e estrelas da sua vizinhança, emitindo intensa radiação enquanto a matéria se acelera, espiralando no disco de acresção, e parte da matéria é ejetada por conservação de momento angular. Na aceleração da matéria, a energia liberada é da ordem de 0,1 mc2, comparada com 0,007 mc2 na reação nuclear mais energética conhecida, a transformação de 4 átomos de hidrogênio em um átomo de hélio. Quando o buraco negro consumir toda matéria circundante, ele cessará de emitir.

No disco de acreção, as regiões internas giram mais rapidamente do que as regiões externas (terceira lei de Kepler), causando a fricção entre as partículas do gás. A fricção esquenta o gás e faz as partículas perderem energia e espiralarem em direção ao buraco negro. À medida que espirala, a matéria é acelerada a velocidades supersônicas e aquecida a milhões de graus, emitindo enormes quantidades de radiação. O espiralamento causa o acúmulo de matéria na borda interna do disco, aumentando a pressão dos gases nesse local. Como meio de se livrar do excesso de pressão, o disco libera parte do gás, que é ejetado na direção onde a resistência a seu escape é mais baixa, ou seja, perpendicularmente ao disco. O campo magnético do gás (que por ser muito quente está ionizado) ajuda a colimar a matéria liberada, formando os jatos estreitos que são observados em grande parte das galáxias ativas.

quasares
Imagens obtidas por John Norris Bahcall (1934-2005) e Mike Disney com o Telescópio Espacial Hubble, da NASA, mostrando que os quasares ocorrem tanto em galáxias normais quanto em galáxias perturbadas. Por exemplo, PG 0052+251 (canto esquerdo superior), a 1,4 bilhões de anos-luz da Terra, reside em uma galáxia espiral normal; PHL 909, a 1,5 bilhões de anos-luz (canto inferior esquerdo), em uma galáxia elíptica; IRAS04505-2958, PG 1212+008, Q0316-346 e IRAS13218+0552, em vários tipos de galáxias em interação.
O modelo mais aceito é que os quasares são buracos negros com massas de 1 milhão a 1 bilhão de vezes a massa do Sol localizados no núcleo de galáxias ativas. No artigo Formation of massive black holes via collisions and accretion, Dominik R. G. Schleicher et al., 2019, Proceedings of Binational AAA-SOCHIAS Meeting demonstram que a proposta de colapso direto de uma nuvem para formar um buraco negro supermassivo não funciona, pois a nuvem se fragmenta. Portanto os buracos negros supermassivos encontrados nos quasares e núcleos de galáxias ativas vêm de colapso de estrelas de alta massa, com subsequente coalescência e acresção. Isto está de acordo com as coalescências de pares buracos negros estelares medidas em ondas gravitacionais pelo LIGO-Virgo-KAGRA (The LIGO Scientific Collaboration and The Virgo Collaboration, GWTC-1: A Gravitational-Wave Transient Catalog of Compact Binary Mergers Observed by LIGO and Virgo during the First and Second Observing Runs, Physical Review X 9, 031040, 2019), e recentes detecções, totalizando 90 detecções..
modelo=5
Um dos quasares mais distantes tem deslocamento para o vermelho (redshift) z=5,0 e foi descoberto pelo Sloan Digital Sky Survey em 1998. Abaixo estão sua foto e seu espectro.
fotoz=5
z=5
Daniel Stern (JPL), Hyron Spinrad (Berkeley), Peter Eisenhardt (JPL), Andrew Bunker (Cambridge), Steve Dawson (Berkeley), Adam Stanford (Davis, IGPP) e Richard Elson (Florida) descobriram o quasar RD300 com z=5,5, utilizando o telescópio de 4 m do KPNO, o 5 m do Palomar e os 10 m dos Kecks.

Para os quasares precisamos usar a fórmula relativística do efeito Doppler para medir a velocidade v através do deslocamento do comprimento de onda observado para o vermelho z:

z\equiv \frac{\Delta \lambda}{\lambda} = \frac{v}{c}\cos \theta \left(\frac{1}{1-\frac{v^2}{c^2}}\right)^{1/2}
onde Δλ=λobservadorepouso, θ é o ângulo entre o vetor velocidade e a linha de visada e c a velocidade da luz no vácuo.
z
Região do espectro original do objeto que é observado no ótico aqui na Terra.
Como os deslocamentos para o vermelho (redshifts) dos quasares são em geral grandes, $z\equiv\frac{\Delta \lambda}{\lambda}$, precisamos utilizar a fórmula do deslocamente Doppler relativístico para calcular sua velocidade. Por exemplo, um quasar que tem deslocamento Doppler $\frac{\Delta \lambda}{\lambda}=5$ indicaria uma velocidade de 5 vezes a velocidade da luz, se utilizarmos a fórmula do deslocamento Doppler não relativístico, $ \frac{v}{c}=\frac{\Delta \lambda}{\lambda}$. Mas o deslocamento Doppler relativístico é dado por:
$z\equiv\frac{\Delta \lambda}{\lambda}=\sqrt{\frac{((1+v/c)}{(1-v/c)}}-1$
de modo que a velocidade é dada por:
$\frac{v}{c}=\frac{(1+z)^2-1}{(1+z)^2+1}$
z=6,4
Em janeiro de 2003, Xiaohui Fan, Michael Strauss, Eva Grebel, Don Schneider e colaboradores do Sloan Survey divulgaram o mais distante quasar até então, com z=6,4, que representa o Universo quando este tinha somente 800 milhõs de anos.
Mas o record desde 2007 era do CFHQS J2329-0301, deslocamento para o vermelho de z=6,43, descoberto por Chris Willott, da Universidade de Ottawa, no Canadá e colaboradores, com o telescópio Canada-France-Hawaii e confirmado com o Gemini. Emmanuel Momjian, Christopher L. Carilli e Ian D. McGreer, publicaram o artigo de 2008, Very Large Array and Very Long Baseline Array Observations of the Highest Redshift Radio-Loud QSO J1427+3312, Astronomical Journal, 136, 344, com z=6,12.
z=7,085
Em 2011, o quasar mais distante, ULAS J112001.48+064124.3, era o descoberto por Daniel J. Mortlock, Stephen J. Warren e colaboradores com dados do Very Large Telescope do European Southern Observatory (ESO), publicado no artigo A luminous quasar at a redshift of z=7.085, na Nature, 474, 616.

O recorde foi quebrado pela galáxia UDFj-39546284, uma galáxia compacta de estrelas azuis, a uma distância de 13,2 bilhões de anos-luz, formada 480 milhões de anos depois do Big Bang, detectada pelo Telescópio Espacial Hubble, com z≃10, no Campo Ultra Profundo do Telescópio Espacial Hubble (HST Ultra Deep Field), mas não confirmada espectroscopicamente. A galáxia UDFy-38135539, com z=8,6, foi confirmada espectroscopicamente por Matt Lehnert e colaboradores.

Em 2012, foi descoberta uma galáxia com redshift z=9,6, com o Telescópio Espacial Infravermelho Spitzer e o Telescópio Espacial Hubble. A luz saiu desta galáxia 13,2 bilhões de anos atrás.

GN-z11 Em 2016 a galáxia GN-z11, mostrada na imagem à direita, descoberta com o Telescópio Espacial Hubble no campo GOODS-N (Great Observatories Origins Deep Survey), com z=11,1, tornou-se a mais distante observada. Ela só foi detectada no infravermelho, em 1,6 μm e 4,5 μm e pela amplificação por lente gravitacional. O Universo tinha 407 milhões de anos quando sua luz foi emitida. Considerando a expansão acelerada no Universo, esta galáxia deve estar a 32,1 bilhões de anos-luz de distância.
HD1 O objeto mais distante observado até 2023, HD1, com z=13,3, indicando que foi formado 13,5 bilhões de anos atrás, foi descoberto por Fabio Pacucci, Pratika Dayal, Yuichi Harikane, Akio K. Inoue, e Abraham Loeb, do Harvard & Smithsonian Center for Astrophysics, e publicado no Monthly Notices of the Royal Astronomical Society: Letters, em 7 de abril de 2022. A grande quantidade de luz ultravioleta que emite vem ou de uma região com altíssima taxa de formação de estrelas, mais de 100 estrelas por ano, ou de um buraco negro supermassivo ativo, ou de uma combinação dos dois. As observações foram feitas com múltiplos telescópios, incluindo o Telescópio Espacial Spitzer Space, o telescópio Subaru no Hawaii, e o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), no Chile. Esta detecção ainda precisa de confirmação espectroscópica. Mais de 200 000 quasares foram descobertos com o Sloan Digital Sky Survey, mostrando a variação do espectro com z.

O novo recordista é JADES-GS-z14-0, observado com o James Webb Space Telescope, de 6,5 metros de diâmetro, formado somente 290 milhões de anos depois do Big Bang.

Radiogaláxias

3C219 0313-192
Superposição da imagem ótica (em azul) com a imagem em rádio (em vermelho) da rádio-galáxia 3C 219, que está a 500 Mpc. Enquanto a galáxia tem 100 mil anos-luz de diâmetro, os jatos cobrem 1 milhão de anos-luz. À direita, o jato em rádio em torno da galáxia espiral 0313-192 (NASA/NRAO).
Radiogaláxias são galáxias que têm uma emissão em rádio muito intensa, em torno de 1033 a 1038 watts, lembrando que a luminosidade do Sol é de 3,83 × 1026 watts. Observadas no ótico, geralmente têm a aparência de uma galáxia elíptica grande, mas, observadas em rádio, apresentam uma estrutura dupla, com dois lóbulos emissores em rádio, localizados um em cada lado da galáxia elíptica, e a distâncias que chegam a 6 Mpc de seu centro. Outra característica das rádiogaláxias é a presença de um jato de matéria saindo da fonte central, localizada no núcleo da galáxia. A explicação mais plausível para os jatos é a mesma dos quasares: partículas carregadas se movendo em um campo magnético. Como a trajetória seguida pelas partículas é helicoidal, seu movimento é acelerado e elas irradiam energia. Uma das radiogaláxias mais brilhantes é Centauro A, localizada na constelação do Centauro, no Hemisfério Sul celeste.
Centaurus A
Imagem da galáxia peculiar Centauro A, mostrando um grande anel de massa em torno da galáxia.

Galáxias Seyfert

Circinus
Foto da galáxia Seyfert Circinus, com dois anéis, um de diâmetro de 1300 anos-luz e outro de 260 anos-luz, obtida com o Telescópio Espacial Hubble.
As galáxias Seyfert, descritas por Carl Keenan Seyfert (1911 - 1960) em 1943 ("Nuclear Emission in Spiral Nebulae", The Astrophysical Journal, 97, 28), são galáxias espirais com núcleos pontuais muito luminosos, em torno de 1036 a 1038 Watts, contribuindo com aproximadamente metade da luminosidade total da galáxia no ótico. O espectro nuclear apresenta linhas de emissão alargadas, de elementos pesados altamente ionizados, e um contínuo não-térmico muito intenso no ultravioleta, cuja estrutura é explicada como devida a movimentos internos muito rápidos no núcleo. Geralmente, a emissão dessas galáxias sofre variabilidade em períodos relativamente curtos, o que leva a concluir que a fonte emissora deve ser compacta, como um buraco negro. Estima-se que aproximadamente 1% de todas as galáxias espirais são Seyfert.

Objetos BL Lacertae (BL Lac)

Os objetos BL Lacertae, também chamados blazares, constituem uma outra classe de objetos exóticos, que apresentam um núcleo muito brilhante e compacto. Têm como principais características a extraordinária variabilidade em curtos períodos de tempo, luz polarizada, e um espectro não-térmico sem linhas de emissão ou absorção. O primeiro objeto desse tipo, e que deu nome à classe, foi BL Lacertae, observado em 1929, na constelação do Lagarto. No princípio, foi confundido com uma estrela, por seu brilho poder variar por um fator de 15, em poucos meses. Muitos desses objetos são também fontes de rádio, e acredita-se que eles sejam rádiogaláxias, orientadas de forma que a linha de visada fica na direção do jato. Atualmente a maioria dos astrônomos aceita que as diversas formas de galáxias com núcleo ativo, como galáxias Seyfert, quasares e blazares, tenham sua fonte de energia originada no mesmo processo básico: gás sendo acelerado por um buraco negro central, liberando energia potencial na forma de radiação.

Comparação entre diferentes tipos de galáxias ativas
Propriedade Radiogaláxias Galáxias Seyfert Objetos BL Lac Quasares
Espectro contínuo não-estelar não-estelar não-estelar não-estelar
Linhas de emissão largas e estreitas largas e estreitas nenhuma ou fracas largas e estreitas
Forma no ótico elíptica espiral incerta estelar
Forma em rádio jatos e lóbulos emissão fraca emissão fraca jatos e lóbulos

O catálogo de galáxias ativas dos franceses Marie-Paule Véron-Cetty e Philippe Véron, Quasars and Active Galactic Nuclei (12th Ed.), publicado em 2006, contém 85 221 quasares (definidos como objetos mais brilhantes que magnitude absoluta B=-23), 21 737 AGNs (Active Galactic Nuclei, definidos como objetos mais fracos que magnitude absoluta B=-23) e 1122 blazares.
957 galáxias foram encontradas em 2016 por observações em HI 21 cm na direção do plano da Via Láctea.
O catálogo com um milhão de quasares até 30 de junho de 2023, versão 8 foi publicado em 2023 no Open Journal of Astrophysics, 6, 49 e o MORX v2 com 3 115 575 quasares rádio e em raio-X, e outras fontes associadas à radio/raio-X, foi publicaado em 2024, no Open Journal of Astrophysics, 7, 6.

As maiores dúvidas sobre as galáxias concentram-se em como elas se formaram, qual é a composição de sua massa escura - que pode corresponder a 85-90% de sua massa total, e porque algumas galáxias parecem ter um buraco negro central que libera uma quantidade colossal de energia quando matéria é acretada.


1Alargamento espectral acontece porque, com estão em movimento aleatório, algumas produzirão um deslocamento das linhas espectrais para o azul e outras para o vermelho. Esses dois deslocamentos, juntos, resultam em um alargamento das linhas.
2Considerando apenas as galáxias grandes e luminosas como a Via Láctea, Andrômeda é a mais próxima, mas incluindo todos os tipos de galáxias, as Nuvens de Magalhães são mais próximas.
Galaxias e z
Variação da forma das galáxias com z=Δλ/λ.
Reionização
Medidas em da radiação de HI (21 cm) [Judd D. Bowman, Alan E. E. Rogers, Raul A. Monsalve, Thomas J. Mozdzen & Nivedita Mahesh, 2018, An absorption profile centred at 78 megahertz in the sky-averaged spectrum] indicam que a reionização, causada pelas primeiras estrelas, ocorreu antes de 180 milhões de anos depois do Big Bang, mas estas medidas são contestadas pelas medidas da Radiação do Fundo do Universo pelo satélite Planck, que indicam que ela ocorreu aos 380 milhões de anos. As primeiras estrelas nascem depois que a quantidade de matéria supere a antimatéria, que os primeiros núcleos atômicos se formem, depois que os primeiros átomos neutros se formem e depois que a força gravitacional causem o colapso destes átomos neutros. Como a gravidade também viaja à velocidade da luz, como demonstrado pela detecção das ondas gravitacionais, as escalas maiores, de galáxias, só colapsam depois das escalas menores, de estrelas.
Os dois maiores buracos negros medidos até agora são o de 40 bilhões de massas solares no centro da galáxia gigante elíptica Holmberg 15A, a cerca de 700 milhões de anos-luz, no aglomerado de galáxias Abell 85, e o recordista, com 66 bilhões de massas solares, no quasar TON 618.


Movimentos Superluminais
Relação de Tully-Fisher, Luminosidade e Brilho das Galáxias
proxima Cosmologia

Volta Astronomia e Astrofísica
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Modificada em 25 nov 2024